Entrevista: Energia elétrica vai ficar mais cara, mas há alternativa, diz especialista

Dois fatores tendem a tornar a energia elétrica mais cara para o consumidor brasileiro nos próximos meses. Um deles é o empréstimo realizado pelo governo federal às distribuidoras de energia para que elas não quebrassem em meio à pandemia. Essa conta já está chegando.

Outro é a estiagem, que já ligou o alerta no Planalto para ativação de usinas termelétricas a fim de preservar reservatórios. Só que este modelo é bem mais caro.

Segundo o especialista do setor e presidente da consultoria em energia Enercons, Ivo Pugnaloni, energia não vai faltar, mas o preço tende a subir. Para empresas médias e grandes consumidoras há uma saída, diz: comprar energia no mercado livre. 

Em entrevista à Rede Catarinense de Notícias, Pugnaloni fala sobre as dificuldades do setor, as possibilidades de economia e sustentabilidade dos negócios. 

Rede Catarinense de Notícias – Este é um momento de crise, em que as empresas estão buscando redução de custos e a energia é uma conta muito importante. Como está essa busca por economia?

Ivo Pugnaloni – Essa pergunta tem duas respostas. Uma para quem já está no mercado livre e outra para quem não está. Para quem não está no mercado livre, tem ainda um agravante: a energia está subindo de preço. A regulamentação do setor elétrico permite que, quando haja um evento como a pandemia, haja uma flexibilização do corte do inadimplente e essa inadimplência tem que ser assumida pelo sistema como um todo. E qual foi a fórmula para resolver o problema? Um empréstimo do BNDES para a distribuidoras, que será pago aumentando o valor da tarifa de quem está adimplente. Não pode faltar o dinheiro, de algum lugar tinha que vir. Um empréstimo que já começou a ser pago. Para as distribuidoras poderem aguentar o tranco. Só que o empréstimo já começa a ser pago com aumento das tarifas. A tendência é de aumentos de até 20%. Isso para quem compra energia de distribuidora.

RCN – E para quem está no mercado livre?

Pugnaloni – Quem está no mercado livre, olha a ironia: o preço caiu. Por quê? Porque a negociação é livre. Como diminuiu o consumo, por exemplo, na área automobilística caiu 65%, teve sobra de energia no mercado. Empresas tinham feitos contratos a R$ 280 pelo MW/h, hoje a energia está cotada a R$ 180. Só que quem sabe disso? Ninguém. Quem poderia avisar é a empresa que vendeu, mas quem vendeu não vai avisar que o preço caiu. Essa é a função de empresas de consultoria, que não tem vínculo com o vendedor.

RCN – O Congresso analisa uma proposta para reduzir o consumo mínimo exigido para ingresso no mercado livre. Essa e outras medidas estão fazendo o setor avançar?

Pugnaloni – Nem precisa de lei, só um regulamento. Só mandar a Aneel fazer. Reduzir o consumo mínimo vai aumentar o mercado livre. Isso é uma maneira. A outra é quem já tem o consumo mínimo, ou próximo disso, entender o que está acontecendo, como está jogando dinheiro fora. Não adianta só aumentar o alcance legal, se não houver o alcance da inteligência de mercado. Porque senão você aumenta e não avisa, ninguém muda, com medo de migrar. O mercado livre tem 20 anos. O número de consumidores que migraram para o mercado livre é ridículo. O empresário tem medo, mas não tem do que ter medo. Já ouviu falar de alguma empresa no mercado livre que ficou sem energia? Nunca, desde que tenha um bom contrato.

RCN – Essa migração para o mercado livre tem gerado um fomento para a geração de energia em pequena escala e distribuída?

Pugnaloni – Sim, há um aumento sensível no número de consultas e de estudos. Só no mês passado, nós fomos contratados para realizar nove estudos. Todos na área de hidrelétrica. Realmente é uma tendência, mas seria uma tendência muito maior se não houvesse essa procura novamente, motivada por fatores emocionais e de falta de informação, do empresário que quer resolver o problema dele no mês que vem. 95% dos consumidores querem gerar sua própria energia, mas não sabem o que é isso. Aí a solução que parece mais óbvia é usar o telhado para produzir energia. Mas quantos anos vai levar para pagar a conta? Em cinco anos você paga o investimento, mas quando é que esse investimento vai se pagar? Por que esse consumidor não passa para o mercado livre? Você pode comprar energia 30% mais barato sem investir nada. Só tem que mudar o fornecedor.

RCN – Esse foco na produção hidrelétrica é mais vantajoso do que outras alternativas?

Pugnaloni – Em Santa Catarina, a gente pode construir uma pequena Central Geradora Hidrelétrica sem sair do Estado. Você pode comprar todos os geradores, todas as turbinas, todo o equipamento eletromecânico, todos os serviços de engenharia, comercialização de energia, planejamento, linhas de transmissão, empreiteiras. Tem tudo para fazer hidrelétricas aqui. Gerando ICMS, ISS aqui. Tem um estudo da Eletrobras que mostra o potencial hidrelétrico do país. É impressionante. Temos potencial para 40% a mais do que tudo que foi construído em 150 anos.

RCN – O tema ambiental tem gerado grande discussão atualmente. Em geral, esses projetos menores têm menor impacto ambiental? 

Pugnaloni – Nós aplicamos projetos e parcerias com as etnias Guarani e Kaingang e fizemos alguns acordos muito interessantes, registrando em cartório. Depois de termos o projeto aprovado pela Aneel, nós pedimos para refazer o projeto e remover o barramento. A queda continua a mesma, a vazão continua a mesma, mas não tem mais água reservada para a seca. O reservatório é tão pequeno numa PCH, numa CGH, que praticamente não guarda água para mais do que dois ou três dias. Se não tiver água em dois ou três dias não adianta o reservatório. Nós adotamos outra solução. Aumentamos o canal de onde vem a água. Esse canal é muito mais barato que a barragem, dependendo do lugar. Você aumenta o canal e vai buscar água antes. Tudo é mais fácil, mais objetivo.